A Conversão: Skinheads habermasianos
“Você é a manhã que se aproxima
e eu a tênue chama desta vela que se esvai.
Conserve esse sorriso até a aurora
Veja, meu amor, como me consumo ao sabor do vento,
Brilhando diante de ti até o último suspiro
Assim como meu coração que arde apaixonado.”
Hafez, de Sheraz
Por Goethe
poeta persa 1320-1389/90
Lied:
Vejam a média exótica
Desfilar de Maiorca a Düsseldorf.
Ela se afoga no próprio tédio e irrelevância
A duras penas recuperaremos as lágrimas, suspiram com cinismo e prepotência ariana.
Karl e seu bando passam da teoria à práxis
A pena é clara: motivo fútil e tratamento especia.l
No manicômio estadual, são obrigados pelo diretor social-democrata Kluge, todos os sábados, diante dos internos, a encenar um novo manuscrito para o próximo festival regional, do Kluge ** qual é e recordista em prêmios e indicações.
Dois enfermeiros armados conduzem Karl ao centro da arena. Algazarra, palmas e assobios. Fundo árcade, campinas floridas, animais compatíveis com ecossistemas auto-sustentáveis, salão lotado de velhinhos, vovós e vovôs punks, ex-combatentes do África Korps uniformizados e condecorados, alguns com o retrato de Erwin Rommel, enfermeiros guardam as saídas.
Latas de cerveja são jogadas no tablado-arena. Com exceção de Karl, os demais os demais permanecem ajoelhados em formação de choque, contemplando o conteúdo de diversos livros de Jurgen Habermas, empunhando espadas de papelão.
Karl ajoelha-se diante de Kluge : Dedicamos o nosso humilde empenho ao Magnânimo Diretor Kluge que nos conduz pela luminosa trilha segura da Ciência neste exercício do Esclarecimento em ato. Algazarra, palmas e assobios.
Kluge (Gesto para que comecem)
Algazarra, palmas e assobios
Karl segura uma rosa branca Durante anos, no silencio de Academias, nós, os puros de coração, perseguimos pelo deserto da abstração, o cálice sagrado do consenso desta generosa República.
Somos culpados sim, nos alemães assumimos de joelhos todas as culpas do milênio. Algazarra, palmas e assobios. Cada um Parsifal em busca do cálice do consenso, onde bebemos ainda o sangue de todas as vitimas, que é pouco diante desta renovada sede.
Já não me lembro mais daqueles anos em que fazia mestrado em Sociologia. Eu era apenas um rapaz de boas intenções a quem as palavras dos compêndios escorriam pelos ouvidos como mel neste oásis entre tâmaras. Sim, o consenso, dizíamos, o consenso normativo daqueles que nos impuseram esta máscara democrática e nos corromperam com os valores ocidentais, jeans e coca-cola
Algazarra, palmas e assobios Foi quando Serap**
surgiu em minha vida. Lembro-me de seu fulgurar, vestindo luto e majestosa com seus cabelos e olhos negros como o leite negro da madrugada. Serap era uma princesa à sombra da qual todos os exércitos marchariam para o inferno de gelo do coração da Groenlândia, sinistra e confusa, o mundo parecia mais simples à sua sombra,
e com Serap avançávamos em linha reta como leigos da alegria em pura ação algazarra, palmas e assobios tão abstrata, sem pudor na tolice que exalava e quando maio chegava Serap
era a mascote de nosso bando, nossa pastora, Serap para o bando, nas campinas verdejantes desta amada Republica! Um dia, em meio às nossas infrutíferas discussões, Serap pôs uma automática sobre a mesa e nos disse que o banco da esquina andava relaxando na segurança nestes tempos bicudos para nossos amados banqueiros, que financiam o ócio de pastorais pensamentos. Foi só saque, como dissemos.
Eu usava a máscara de Adorno e meu fiel companheiro Jens de Horhkeimer, e Matthias resolveu se vestir de policial californiano, só para garantir nossa própria segurança algazarra, palmas e assobios, licença poética de Serap diante das aporias no fronte da dialética.
Serap nos dissera que ainda surfaríamos, leigos da alegria, sob o sol de Maiorca e que estaria no carro, mas o único carro que nos esperava na porta era a viatura de nossa democrática Polícia, que nos recebeu em júbilo com a imprensa local.
Foi nos olhos de Serap que reconheci todos os inimigos do Esclarecimento, mas foi nesses olhos que eu me reconheci como meu verdadeiro inimigo. Cada um sua propria República e Serap libertou a serpente adormecida em meu coração com seu alemão de mestiça.
Algazarra, palmas e assobios Agora acabou, o consenso acabou (rasgam volumes de Habermas e da “Teoria da Ação Comunicativa”). (êxtase na audiência). Somos a vanguarda do ódio pela qual cada cidadão de nosso generosa Republica se orgulha e transformaremos novamente o mundo inteiro numa imensa prisão.
(Júbilo na audiência, enfermeiros de prontidão a um sinal de Kluge) A língua é um sistema compulsório. Morte a todos os inimigos do Esclarecimento! Choro convulsivo, joga a rosa branca no chão. Mordem os livros como cachorros enfurecidos. Enfermeiros chutam todos no chão, morfina.
Kluge No próximo sábado, retomamos os ensaios.
Internos aplaudem efusivamente, carregam Kluge nos ombros e cantam
a velha canção do fronte: “In der Heimat, in der Heimat, da gibt s ein Wiedersehen...”
*O ator que desempenhar Kluge deverá estudar as fotos de Foucault e, se possível, passar na calva produtos que realcem a iluminação.
** Serap: nome feminino em turco para “miragem”, “fantasma do deserto”
Há muitos anos venho escrevendo minha versão pop de "Tommy", mas feminina, com minha persona feminina. Este é um texto terrivelmente dolorido para mim. Abomino todos os falsos profetas, todos aqueles que desprezam a herança de Compaixão (Mitleid) e Graça (Gnade) pela fragilidade do humano no deserto mineral da barbárie, e desprezo, particularmente, a figura de Michel Foucault e seu apoio cego à Revolução Islâmica, seus escritos INFAMES publicados na Itália, que pavimentaram o caminho do novo Imã à tirania, pois acredito e vou defender com todos os meios a sociedade aberta contra todos os seus inimigos internos e externos. Os piores tiranos sempre vêm sempre do exterior
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